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![]() Entrevista exclusiva de Paulo Camillo Penna, Presidente do IbramPublicado em: 27/07/2006 23:21:00
Entrevista exclusiva dada por Paulo Camillo Vargas Penna*, Presidente do Ibram (Instituto Brasileiro de Mineração), ao Portal do Geólogo em 24 de julho de 2006
*Paulo Camillo Vargas Penna, advogado, mineiro de BH, assumiu a Presidência do IBRAM em maio deste ano tendo em sua bagagem relevante experiência anterior.
1. Dr. Paulo, gostaríamos de começar a entrevista com o senhor falando um pouco da conjuntura da mineração no Brasil, em como o Sr. vê a produção mineral, as exportações, as deficiências, as evoluções, etc. A mineração brasileira está atravessando um boom, que na verdade não é exclusivo do setor no país, onde uma série de fatores acabam por ser determinantes: primeiro, tem-se um momento de exuberância no desenvolvimento mundial, os países que classicamente puxam a economia mundial, como os Estados Unidos e os da Europa estão crescendo, o Japão já está crescendo; a eles se juntam outros dois elementos, a China e a Índia, então, efetivamente eles contribuem de maneira singular. O Brasil contribui de
maneira importante no boom da mineração ao produzir vários minerais, com o minério de ferro como carro-chefe. A China e a Índia, ao demandarem tanto minério, fazem com que o país passe por um crescimento drástico, com perspectivas muito boas: a princípio seria um ciclo de dez anos, que é o prazo com os quais as empresas fazem seu planejamento estratégico, mas tudo indica que o atual ciclo deva durar mais de dez anos e não se encerrar em 2010; já se fala em 2015, 2016. As empresas já estão se preparando para isso. Para se crescer na mineração é preciso analisar fatores como o da logística: a famosa rigidez locacional que existe no setor impõe ao Brasil uma infra-estrutura em terrenos onde o país efetivamente deixou de crescer há muito tempo. O transporte ferroviário está estagnado no Brasil há 50 anos, e investir nisso é muito importante, tanto que as empresas de mineração, aliadas a seus parceiros como os da área da siderurgia e mesmo com outros setores da cadeia produtiva, como a agricultura, fazendo investimentos importantes para dar condição ao escoamento do aumento da produção e obtendo, assim, um retorno maior na questão mineral. O problema mais sério tem a ver com a baixíssima taxa de investimento, uma poupança interna muito baixa, e você então vai exigir da iniciativa privada esse tipo de investimento. Como os recursos são limitados, efetivamente o crescimento será à altura da disponibilidade. Enquanto não tivermos um investimento voltado à infra-estrutura, não teremos um grande salto da mineração no Brasil, que é o que todos esperam; por enquanto, a iniciativa privada não tem capacidade de fazer esses investimentos em um prazo maior do que dez anos. É preocupante que o Brasil não tenha feito investimentos à altura do que é necessário, mas apesar disso as perspectivas são muito boas porque o país tem uma carteira muito grande de recursos minerais, que têm e terão participação importante. Um bom exemplo disso é a bauxita, onde o país hoje ocupa o quinto lugar na produção mundial, e a perspectiva é de que, em cinco anos, cheguemos ao segundo lugar, com avanços também na produção do alumínio. E nesse caso, o problema é mais uma vez a infra-estrutura: o Brasil poderia estar produzindo alumínio primário, mas não se há a energia elétrica necessária para tanto. Há projetos no norte do país, na bacia Amazônica, em que não se pode verticalizar até a liga metálica, limitando-se ao mineral, por conta disso.
2. As negociações para os novos contratos de minério de ferro levaram mais tempo que o habitual, só se encerrando no final de maio. Nos últimos anos, o produto teve altas absurdas, chegando a 71% em 2004/05. Quais são suas considerações para o futuro do minério de ferro, um dos maiores produtos da pauta de exportações do Brasil? Essa é uma pergunta muito feliz; efetivamente, são os reajustes nos preços do minério de ferro que estão bancando o aumento da produção. Não só os de 72% e 19%, eles não foram única e exclusivamente pelo custo do minério, mas pelo custo que você tem ao acelerar a indústria, que está num momento crítico de produção, extremamente frágil e trabalhando no limite da segurança para oferecer o maior volume possível de minério no mercado mundial; com isso, muito deste reajuste tem sido repassado imediatamente para a parte da infra-estrutura: aumento de escala, renovação de equipamentos, investimentos em transporte, compra de vagões, etc. Para se ter uma nova máquina hoje, como uma locomotiva, leva-se de 18 a 36 meses, então o que existe é uma aceleração do investimento para suprir a demanda. As pessoas se esquecem que aumentos dessa natureza só ocorreram vinte anos atrás, e os últimos reajustes vinham ficando mesmo abaixo dos reajustes do preço do aço. Desta forma, os reajustes aplicados ao minério de ferro, nesses níveis, dizem muito mais aos investimentos que se têm de aplicar do que à demanda em si.
3. E o senhor acha que haverá uma continuidade nesses índices de reajuste ou acha que os investimentos em infra-estrutura já foram “pagos” com os últimos ajustes? Eu não sei te dizer, mas é o seguinte: a China, que imaginava que cresceria agora por volta de 8% em 2006, já está crescendo a 11%. Assim, enquanto eles estiverem nesse ritmo, e a Índia também, a lei da oferta e da procura prevalecerá. Nos próximos dez a vinte anos, cerca de dois Brasis, 300 milhões de pessoas, sairão do meio rural para a cidade, e isso demandará muitos metais para a construção de casas, estruturas, automóveis. E enquanto isso ocorrer, será demandado muito minério de ferro. Ao mesmo tempo em que você vê o crescimento no metal, outras minas serão descobertas e exploradas. Mas não acredito que tenhamos um pico tão grande quanto o verificado no ano passado. 4. O IBRAM tem uma imagem de ser um representante do grande minerador. Quais são as principais diretrizes e metas da nova diretoria do IBRAM? Nós temos um instituto em pleno vôo, com um conjunto de projetos em andamento e comitês permanentes que têm trabalhado em todo o Brasil, como o Comitê de Assuntos Legislativos e Jurídicos, que tem atendido ao setor, acompanhando as mudanças legais e propondo alternativas na legislação, nas portarias, normas e regulamentos. Ao mesmo tempo, há uma série de novos projetos, dentre os quais eu gostaria de destacar um deles: um plano de imagem para a mineração, que é algo essencial para o nosso desenvolvimento.
Efetivamente, a nossa imagem junto à população não é uma imagem positiva; por desconhecimento e desinformação histórica, a imagem da mineração não é uma boa imagem. Ela sempre é vista como poluidora, desagregadora, contrária aos interesses regionais, contrária aos interesses do país, quando não é nada disso. A mineração interiorizou o desenvolvimento no país, desde o ciclo do ouro, passando por outros momentos importantes, e a partir dela se desenvolveram centros urbanos importantes, equipados com a infra-estrutura necessária para o desenvolvimento social. Ainda assim, a imagem da mineração não é muito boa.
Sobre o nosso plano de melhoria da imagem do setor: nenhum trabalho de natureza política ou social pode ser desenvolvido sobre uma base inverídica, uma base de desinformação. Vamos estimular e propagar a informação verdadeira, mostrar o que a mineração faz pelo desenvolvimento do país, qual a interação que se tem com a sociedade brasileira, fazer uma campanha parecida com a que foi feita com a agricultura. Você tinha aquela imagem do caipira, do Jeca Tatu, que era a imagem antiga da agricultura, que se conseguiu transformar, através de um trabalho muito bem feito pelo setor, naquilo que ela realmente é para o país: geradora de empregos, riqueza, integração nacional, etc. Traçando um paralelo, é uma boa referência para o nosso trabalho.
Além disso, temos questões de importância política, como a da representação. Muito nos preocupa o desequilíbrio que existe hoje no setor mineral, em vários colégios de discussão do desenvolvimento, onde ou somos desconhecidos ou somos minoria. Esse desequilíbrio é tema de nossas discussões e será abordado em documento que levaremos aos candidatos à Presidência, de modo a melhorar a participação da mineração, e de outros ramos do setor produtivo nesses colegiados.
5. O senhor mencionou essa imagem falsa de que a mineração é um sinônimo de desmatamento, de despreocupação ambiental, quando na verdade, às vezes, a agricultura e a pecuária são muito piores para o meio ambiente... Sim, temos inclusive estudos do Banco Mundial onde estão listados os percentuais de responsabilidade sobre essa exploração no Brasil. A mina, a lavra, se dão em espaços extremamente pequenos, comparativamente, e não se tem essa informação gerada para um público maior. Existe uma visão equivocada até entre os mineradores de que você teria que atuar em municípios mineradores em primeiro lugar, mas eles se esquecem que em qualquer cidade, quando você entra, existe uma atividade de Construção Civil, como uma pedreira, mineração de agregados, um porto de areia, onde há esse contato tanto quanto em áreas isoladas de mineração. Esse tipo de atividade é o contato mais próximo que as pessoas das grandes cidades têm com a mineração, então não há como haver uma imagem tão boa – mas elas se esquecem que é aquela areia, aquela pedra, aquele cascalho que possibilita a construção de edifícios, casas, hospitais.
O estudo do Banco Mundial sobre a indústria extrativa mostra que, da superfície terrestre, a desagregação do meio ambiente se dá principalmente pela pecuária (35%), pela derrubada de florestas (30%) e pela agricultura (27%). A mineração afeta em torno de 1% da superfície terrestre. Então, há inúmeros dados mostrando o papel residual da mineração na degradação do meio ambiente; mesmo assim, alguns problemas, como a contaminação da água pelo mercúrio, afetam a visão das pessoas; esses problemas foram ocasionados pelo garimpo clandestino e as pessoas não sabem distingui-lo da mineração, o leigo não faz a mínima idéia do que cada um significa. Hoje em dia, o setor ocupa posição de destaque, gera 2,5 milhões de empregos, produz 150 bilhões de reais por ano, responde por 10,5% do PIB e 25% da balança comercial. São números bastante expressivos, e dão uma idéia da qualidade da mineração e sua importância para o país.
6. Garimpos x pequenos mineradores: como o IBRAM vê esse problema, que cria uma mineração predatória terceiro-mundista que é o garimpo? Como fazer a transição entre o garimpo e a mineração? Nós estamos começando, agora, a trabalhar com o Ministério de Minas e Energia, desenvolvendo um projeto relacionado na Agenda 21; trata-se de um projeto de cooperativa, que é o salto entre o garimpeiro e o minerador, para que a cooperativa se transforme em uma empresa. As discussões serão com a Secretaria de Geologia e Mineração do MME. Já existem recursos do Banco Mundial alocados para o projeto-piloto, que está sendo desenvolvido e será nossa contribuição para essa transição.
7. Existem associados entre os pequenos mineradores e junior companies? Quantos por cento dos sócios são efetivamente pequenos? O IBRAM é escalonado e não apresenta nenhuma restrição à entrada de empresas de qualquer porte em seus quadros, desde que elas tenham vínculo com a atividade mineral. Além do minerador, temos prestadores de serviços como escritórios de advocacia, empresas de logística e outras em nossos quadros. Você falou em júniores, e o Brasil hoje não tem uma coisa muito importante: linhas de financiamento da poupança privada, como no Canadá, onde as júniores são fomentadas e desenvolvem a mineração. A contribuição associativa do IBRAM é escalonada, buscando facilitar a entrada das empresas. Hoje são 189 empresas associadas ao IBRAM, sendo cerca de 90 empresas de mineração, mas não tenho dados sobre são do porte de uma júnior. Quanto a elas, o sistema canadense possibilita mesmo que as júniores desenvolvam mesmo a mineração no Brasil, quando elas recebem os investimentos por lá e se interessam por áreas no país.
8. O senhor acha possível começar um programa de incentivo às empresas junior brasileiras para que se adeqüem as exigências do mercado (Novo Mercado) podendo abrir o capital na Bovespa e permitir ao mercado brasileiro financiar a pesquisa mineral que irá descobrir os jazimentos futuros, a exemplo do Canadá? Acho sim, mas infelizmente o Brasil ainda não tem uma cultura, uma tradição de investimento; apesar disso, o mercado de ações brasileiro vem passando por um refluxo há quatro ou cinco anos, com aberturas de capital e emissões de novas empresas na bolsa. Cabe às autoridades abrirem esse tipo de possibilidade. As linhas de crédito de órgãos que financiam o desenvolvimento, como o BNDES, deveriam facilitar o desenvolvimento, aceitando como garantia de empréstimos uma mina ou uma lavra, por exemplo, o que ainda não tem ocorrido mas é um outro ponto que será trabalhado junto aos candidatos à Presidência da República: a ampliação das linhas de crédito através de garantias reais como as minas e lavras, que por enquanto não vêm sendo aceitas.
9. Recentemente, houve denúncias de fraude na entrega de certificados Kimberley no país (no DNPM), o que deu margem ao tráfico internacional de diamantes, na maior parte das vezes extraídos na África e “lavados” no Brasil – mas também a produção nacional é afetada. Como o IBRAM viu isso, e o que pode ser feito pelo órgão? Vemos a necessidade de que seja feita uma apuração policial, colocando na cadeia todos os responsáveis por isso – trata-se de fraude, nada menos. A apuração do Ministério Público Federal me parece correta, com a intervenção nos DNPMs de Minas Gerais e do Paraná, e não há porquê encarar isso com uma ótica meramente civil: devem haver punições penais para esse tipo de comportamento, agravado pela corrupção de funcionários públicos.
10. O governo vem criando reservas naturais na Amazônia, e algumas delas estão inviabilizando completamente a mineração na região – a área do Tapajós surge como um exemplo recente. Hoje vastas áreas altamente interessantes economicamente foram transformadas em reservas impedindo a mineração que não devasta e rehabilita a floresta após o período de lavra. Há até mesmo a tendência de equiparar a mineração na região ao desmatamento. O que o IBRAM acha de tudo isso e o que se pode fazer? O Brasil está desprezando uma possibilidade de desenvolvimento econômico e social ao agir desta forma, sem que haja critérios efetivos para a criação dessas unidades de conservação. É uma preocupação grave, por se refletir no campo econômico. Já se há restrições sérias quanto à mineração em terras indígenas, e estamos trabalhando, discutindo com o governo, formas de desenvolver a área e trazer benefícios à população indígena. Conhece-se o potencial mineral dessas reservas indígenas, e há exemplos anteriores à Constituição de 1988 (que vedou a exploração nas áreas), que continuam a exploração em terras indígenas com absoluto sucesso e nenhum problema, como a cassiterita explorada pela Paranapanema. A partir de agosto, o setor mineral participará mais efetivamente da discussão de um anteprojeto, feito por governo, FUNAI e representantes dos povos indígenas, reabrindo esta possibilidade – até o final de julho, os representantes dos índios acertarão alguns detalhes. Já nos colocamos à disposição para o debate. Outras áreas, como a Serra do Caparaó (MG), também merecem ser discutidas, além das regiões amazônicas e pantaneiras. De forma geral, vemos com bastante preocupação esta discussão.
11. Por muitos anos a mineração brasileira tem vindo à reboque de poucos e importantes acontecimentos sempre causados por grandes players como a CVRD. Pouco foi efetivamente criado pelos órgãos como o IBRAM. O que pode se dizer a respeito? Há espaço para as pequenas empresas, e isso é uma realidade mundial. Isso vai até o limite da viabilidade. Há espaço para a mineração de especialistas e para avanços tecnológicos. Você citou a CVRD, e o caso dela é interessante: durante um período, ainda como estatal, ela teve um leque de minerais explorados muito grande, que se encolheu durante a privatização e voltou a se expandir recentemente, trocando de estratégia. Por isso, acho que as júniores podem ter espaço, investindo em tecnologia e tendo capacidade empreendedora. Além disso, a questão-chave, como em qualquer outra atividade, é o financiamento.
12. O quê o IBRAM pensa sobre a nacionalização da mineração em alguns países sul-americanos, em especial a Bolívia? A EBX, do Eike Batista, perdeu muito dinheiro por lá, por exemplo, para não falar da Petrobras... Esse tipo de comportamento é um retrocesso, o mundo já passou dessa época. Não é um comportamento que caiba a um Estado, mas um equívoco. Há agora. notícias de modificação nas leis venezuelanas, o que não nos surpreende. A questão boliviana é um equívoco histórico, e que rapidamente será comprovado. Felizmente, creio que essa identificação não vá ocorrer no Brasil.
13. No caso boliviano, o IBRAM tomou alguma medida ou pensa em tomar? O IBRAM viu com preocupação esse tipo de comportamento, esse interesse nacionalista. O governo brasileiro se colocou, no episódio, de forma bem menos efusiva do que esperávamos num momento desses. De forma geral, quem perdeu um grande negócio foi a Bolívia, que deixou escapar uma oportunidade de verticalizar a indústria e sair da atividade primária. E estamos acompanhando com especial atenção o imbróglio envolvendo o petróleo e o gás. Durante as negociações do minério de ferro, observou-se o início da formação de um cartel na China, ao redor da Baosteel, o IBRAM se manifestou, preocupado com esse tipo de comportamento, que poderia ser ampliado para outros países; os governos de Austrália, Reino Unido e Brasil posteriormente se manifestaram no mesmo sentido.
14. Finalmente, gostaríamos que o senhor falasse dos congressos que o IBRAM promove em setembro, (IV Congresso Brasileiro de Mina Subterrânea e IV Congresso Brasileiro de Mina Subterrânea). Temos um recorde no número de inscrições para os congressos, já encerrados, e esperamos inovar, fazendo uma feira para os profissionais da mineração, estudantes da área e profissionais de setores conexos. Para este congresso, o filtro de atividades e congressistas é mais rigoroso, e o evento será altamente técnico. Outra conotação importante é o caráter internacional que um Congresso desses deve ter, então procuramos inserir temas e visões internacionais sobre o setor. Além disso, temos procurado integrar as várias praças da mineração brasileira, como o Pará, cuja produção foi um tanto esparsa durante um bom tempo. No próximo dia 24 de agosto, apresentaremos os trabalhos desenvolvidos pelo IBRAM no ano passado, com uma série de palestrantes discutindo o setor. Alguns estados de menos tradição mineral mas com atividades bastante grandes, como Goiás e Bahia, também serão alvo de nossa atenção, e precisam ser integrados.
Autor: Pedro Jacobi - O Portal do Geólogo
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