Setor Mineral – Voltar para Avançar
Noevaldo A Teixeira (Assessor do SGB-CPRM)
O Código de Mineração, promulgado em 1967, propiciou o mais importante
fluxo de descobertas minerais do país. Capitais internacionais no
início, seguido por investimentos governamentais e privados, permitiram
a descoberta e implantação de várias minas em Carajás (Fe, Mn, Au, Cu,
Ni), Trombetas (Al), Paragominas (Au) Catalão (P, Nb), Tapira (Nb, P,
Ti), Serrinha (Au), Araxá (U) Lagoa Real (U), Puma-Onça (Ni) Pitinga
(Sn), Niquelândia (Ni), Barro Alto (Ni), Cana Brava (Amianto). Pode ser
dito que excetuando o ferro de Itabira, todo o patrimônio mineral
brasileiro que ocorreu foi construído sob a vigência, do atual código de
mineração. Não interpretem tais argumentos como se aqui estivesse sendo
dito que o mesmo não poderia ser melhorado.
Da implantação do código de 1967 até o momento, o setor mineral passou
por cinco momentos de estresse, quatro deles decorrentes da insensatez
governamental:
1.
Criação da Reserva Nacional do Cobre
2.
Reserva Garimpeira de Serra Pelada
3.
Nacionalização da Exploração Mineral
4.
Novo Marco Regulatório
5.
Desastre Ecológico de Mariana
A reserva Nacional do Cobre instituída pelo Decreto nº 89.404, de 24 de
fevereiro de 1984, resulta de uma cruel combinação de ignorância
geológica, corporativismo estatal e nacionalismo infantil. Uma possível
correlação geológica entre Carajás e uma grande área na fronteira do
Pará com o Amapá, levou alguns militares a convencerem o governo de que
criando uma reserva nacional do cobre, resolveria nossa crônica
dependência de metais básicos (cobre-zinco-chumbo). O problema
certamente não foi resolvido. Tal decisão, ao contrário, criou uma
enorme instabilidade jurídica, visto que a área já continha direitos
minerários de algumas empresas. Os direitos minerários não foram
respeitados em flagrante agressão ao código de mineração. Nada ganhamos
com isso, pois impedimos investimentos empresariais, favorecemos a
atividade garimpeira, que de cobre, nunca produziu um grama sequer. O
mais absurdo é como isso pode ter permanecido até hoje, constituindo uma
situação em que um erro geológico foi oficializado por lei. A não
revogação dessa insensatez só pode ser creditada à total
inexpressividade política do nosso setor mineral.
A invasão das áreas da Vale, com direitos minerários, por garimpeiros,
levou a explosão do garimpo Serra Pelada. O falso Eldorado nada deixou
além de um rastro de miséria, endemias e um melancólico poço onde o
mosquito da malária prolifera impunemente. Mais uma vez, a demagogia e
desrespeito à lei levou o setor mineral a uma situação de insegurança
jurídica, que tanto mal provoca a esse setor, por si só, carregado de
riscos e dificuldades. Na verdade, o episódio Serra Pelada foi apenas um
dos inúmeros desrespeitos ao código de mineração. No texto
constitucional de 88, ficou explicitado o favorecimento à garimpagem em
detrimento da atividade empresarial. Em 1980 éramos o quarto produtor
mundial de ouro, hoje somos o décimo quinto, comprovando mais uma vez a
nossa fragilidade setorial diante das decisões demagógicas.
Na crise de 2008, os fundamentos do sistema capitalista foram
apressadamente questionados pelos idólatras do Estado. Alguns países
produtores de bens minerais (Peru, Austrália, Zâmbia, Mongólia), em um
momento de pouca lucidez, viram a oportunidade de incrementar receitas e
exercer maior controle sobre suas “riquezas minerais”. Para isso,
correram em direção aos aumentos de impostos e introduziram mudanças
restritivas e de cunho nacionalistas em suas respectivas legislações
minerais. Aqui demos a nossa contribuição aos ventos mundiais por maior
tributação, regulação e penalização aos “especuladores”. O governo,
tomando como base o setor petrolífero e reivindicando a defesa dos
interesses nacionais, propôs um novo marco regulatório para mineração
que substituiria o “obsoleto” código de 1967.
O novo marco regulatório parte de um diagnóstico até razoável: 1) Há uma
clara desproporção entre o numero de áreas requeridas e o volume de
recursos efetivamente aplicado em exploração, 2) Algumas empresas,
usando artifícios legais mantêm indefinidamente direitos minerais que
deveriam ser transitórios. Certamente ambos os aspectos são
profundamente prejudiciais ao setor e à sociedade, pela simples razão de
que ambos retardam o fluxo de descoberta de novas jazidas. Não tendo
descobertas não haverá mina, produção, emprego, divisas, desenvolvimento
etc. Se o governo acertou no diagnóstico o remédio foi totalmente
inadequado.
Imaginei que tínhamos aprendido com os erros constitucionais de1988. A
constituição cidadã ao nacionalizar o risco, penalizou justamente a
etapa de maior incerteza da atividade mineral. Com a
Emenda Constitucional nº 6 /95,
reparamos tal equívoco trazendo de volta os investimentos, empregos e
descobertas. Parece ser do nosso DNA aprender apenas com o sofrimento e
não com os exemplos. O novo marco regulatório ao propor o término do
direito de prioridade na exploração, repete melancolicamente os erros de
1988, agora com uma argumentação ainda mais incompreensível. O certo é
dizer que o novo marco como está, inviabiliza totalmente as atividades
de exploração mineral em novas áreas do território nacional.
É verdade que o novo marco não nacionaliza e tão pouco estatiza, mas ao
usar o setor petrolífero como modelo comete um monumental equívoco. Do
ponto de vista científico, os procedimentos exploratórios para o setor
petrolífero e de metais são genericamente similares. Temos que saber
onde os minérios ou o óleo se formou, como ele migrou, e finalmente onde
se depositou. Mas do ponto de vista econômico e empresarial há uma
distinção gigantesca entre os dois setores.
O custo de um único poço da
Petrobras no Pré-Sal pode equivaler ao que é gasto em exploração por ano
pelas três maiores mineradoras mundiais.
Dos cinco momentos de estresse citados logo no inicio deste texto,
apenas o último não foi induzido ou provocado pelo Estado. Não foi
responsabilidade do estado o terrível acidente de Mariana. Mas não há
como eximi-lo de sua parcela de responsabilidade. Responsabilidade dos
dirigentes e de políticas públicas que permitiram a destruição lenta e
progressiva do DNPM. Há trinta anos mostrávamos a inadiável necessidade
de modernizarmos e sanearmos essa instituição, para que ela fosse capaz
de atender suas atribuições institucionais. Nada foi feito e sua
capacidade de fazer cumprir a lei e seu dever de alertar para possíveis
negligências empresariais foram inteiramente inviabilizados.
O que causa estranheza, é que os problemas estruturais e conjunturais do
setor mineral brasileiro vêm sendo apontados e criticados há mais de
trinta anos. E por que nada é resolvido? Infelizmente porque ainda não
aprendemos que leis e novos marcos não resolvem problema algum. Ao
contrário, trazem insegurança jurídica afugentando principalmente os
investimentos exploratórios. Se novas leis resolvessem nossos problemas,
já tínhamos dizimado a corrupção, miséria e 50 mil assassinatos por ano.
Acreditamos que os principais problemas do nosso setor seriam plenamente
resolvidos se os órgãos públicos cumprissem seus deveres institucionais
e as empresas não procurassem brechas jurídicas para defenderem
unicamente interesses pontuais. É sempre assim. O setor público não
cumpre suas obrigações diante do contribuinte e transferimos as
responsabilidades para algum advogado de plantão preparar um novo
projeto de lei.
Por que o DNPM aceita renovações totalmente injustificadas tecnicamente?
As mesmas permitem aos detentores de pedido de pesquisa e alvarás manter
sob os seus domínios milhares de hectares. Por que os órgãos ambientais,
muitas vezes conduzidos por forte viés antimineração, protelam
injustificadamente a liberação das licenças, às vezes até mesmo por
interesses políticos? A questão
fundamental do setor mineral no Brasil não é o número de áreas
requeridas, mas
Há trinta anos já dizíamos no Jornal O Globo (Abril de 1988): “A
dinamização do setor mineral brasileiro passa por medidas que incentivam
a aplicação de capitais de risco, venham de onde vierem, e
principalmente pela modernização do aparelho estatal para que fiscalize
a aplicação com rigorosidade absoluta, punindo quem não cumpre o Código
de Mineração. Em relação ao setor, devemos empreender profundas
mudanças. Estas passam necessariamente pela consolidação do DNPM como um
Bureau of Mines, e da transformação da Companhia de Pesquisas e Recursos
Minerais (CPRM) no serviço geológico nacional, similar aos EUA, Canadá,
Austrália, Finlândia.”
O serviço SGB foi criado, mas os produtos por ele gerados estão longe de
apresentarem a mesma qualidade técnica ou científica dos países citados.
A aprovação de medidas contrárias à mineração quase sempre decorreu de
alianças entre parlamentares tanto à esquerda quanto à direita,
portanto, não é fruto de um posicionamento ideológico. Pagamos um
elevado preço pelo desconhecimento entre os parlamentares e a própria
sociedade do que é o setor mineral, o qual é tido como sinônimo de
riqueza fácil e desgraça ambiental. Fugir do debate, se omitir ou levar
ao governo meramente demandas pontuais sempre relacionadas com impostos
têm sido a principal razão pela nossa insignificância política. Quem
representa o setor mineral?
Necessitamos ter uma visão sistêmica do setor onde a exploração mineral deve ter um papel fundamental, pois ela é o inicio de tudo. Temos que retomar o ordenamento jurídico de 1967, modernizando totalmente o DNPM através da informatização e restabelecendo padrões éticos inegociáveis. É essencial implantar um sistema tributário inteligente que contemple a ciclicidade da produção mineral (“banda tributária”). Temos que enfrentar as deficiências científicas e técnicas do SGB-CPRM, dando continuidade às reformas estruturantes pelo qual passou a instituição nos últimos três anos. O resto é com os investidores. Só assim avançaremos, estancando o desemprego e o desinvestimento que, há algum tempo, assola o setor mineral brasileiro em um quadro internacional de absoluta desfavorabilidade à mineração.
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